Inferência forte mais mais.


Para mais um dos bons e velhos trabalhos de disciplina da pós-graduação tive a sorte de entrar em contato com o trabalho publicado na Science em 1964 por John R. Platt, hoje conhecido apenas por Strong Inference (SI). O questionamento feito pelo autor é sobre a diferença de avanço existente entre áreas do conhecimento, e sua resposta aponta para uma questão de método. Platt lembra que a ciência é feita baseada em hipóteses, mas que o fato de muitos trabalhos serem feitos ao redor de “uma única hipótese” pode tornar os resultados enviesados dado que o fator emocional levaria o cientista a um apego à mesma. Assim, o trabalho de Platt aqui comentado se dá a tarefa de discutir uma forma de amadurecer o método de pesquisa a que ele chamou de inferência forte.

Ao observar áreas prolíficas como biologia e física, Platt ressalta uma prática sequencial e cíclica que envolve: (i) a criação de um conjunto de hipóteses e (ii) a elaboração e execução de experimentos capazes de contestar tais hipóteses; ciclo este que seria fundamental para o sucesso de tais áreas. Para o autor não existe forma mais consistente de abordar áreas desconhecidas e gerar conhecimento: o cultivo (e poda) de uma árvores de hipóteses interrelacionadas testadas por experimentos. Desta forma, apenas as ideias capazes de resistir aos testes mais exaustivos seriam consideradas verdadeiras, mesmo que temporariamente. Neste sentido, a (auto-)crítica de trabalhos científicos poderiam partir de duas perguntas:
  1. ao se deparar com um fato: que experimentos poderiam derrubar tal fato?
  2. ao se deparar com um experimento: que hipótese este experimento busca disprovar? 
Cria-se assim um ambiente minimamente formal e focado no desenvolvimento do conhecimento científico.

Com meio século de publicação SI tornou-se um trabalho conhecido e citado centenas de vezes. Uma parte destas citações, como esperado e necessário, levanta detalhadamente os pontos fracos do mesmo, como é o caso do The weakness of Strong Inference, 2001, por William O'Donohue; que contesta desde as citações históricas feitas por Platt, até pontos específicos do funcionamento do "método científico sugerido". Outros trabalhos mais brandos focam em complementar as ideias inicialmente propostas como é o caso de What's wrong with single hypothesis? de Don L. Jewett que aponta soluções mais pragmáticas para a geração de hipóteses de pesquisa. Enquanto Platt não discute bem e deixa para "a criatividade do pesquisador" a tarefa de criar tais hipóteses, Jewett aponta que as práticas formais de exploração e criação de experimentos piloto, apesar de muitas vezes vistas como secundárias, deveriam na verdade ser adotadas como passos fundamentais para uma prática científica ainda mais forte.

Contudo, encerrarei este pequeno texto de apresentação do trabalho de Platt sem me aprofundar nem no próprio, nem nas suas críticas. Em algum momento no futuro pretendo fazê-lo e revisar textos como o Strong Inference: rationale or inspiration?, 2006, por Rowlanf H. Davis; que afirma que possivelmente Platt não tinha a intenção de construir um método formal de pesquisa mas apenas apresentar uma intuição. O mesmo Davis sugere que tanto os apoiadores quanto os críticos da SI a levaram demasiadamente a sério. O que posso dizer é que o texto de Platt é inspirador e que mostra uma ideia inicial sobre a ciência que acredito ser válida, principalmente para iniciantes como eu, mas que precisa sim ser especializada a cada passo dado nas atividades de pesquisa.

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